Um estudo pioneiro, desenvolvido na Reserva Natural das Berlengas (RNB) por uma equipa de biólogos marinhos, integrada pelo investigadores do MARE Marisa Batista, Miguel Pais, Sofia Henriques e Catarina Abril, foi recentemente publicado na revista científica Frontiers in Marine Science. Este estudo foi realizado no âmbito do projecto “FindRayShark - Aplicação de Tecnologias Inovadoras na Conservação de Raias e Tubarões”, financiado pelo Fundo para a Conservação dos Oceanos do Oceanário de Lisboa e Fundação Oceano Azul.
O estudo gerou mapas de distribuição de tubarões e raias e de intensidade de atividades humanas, combinando-os para identificar áreas de maior sobreposição, através de um índice de risco de conflito espacial desenvolvido para este estudo. Para tal, partiram da recolha do conhecimento de pescadores e população local, através de inquéritos, complementado em seguida com várias metodologias não-invasivas, nomeadamente câmaras de vídeo com isco, dados de observadores científicos a bordo, avistamentos partilhados nas redes sociais e plataformas de ciência cidadã (e.g. Biodiversity4All).
Os tubarões e as raias crescem lentamente, têm grande longevidade e produzem pouca descendência, características essas que podem tornar algumas das espécies mais vulneráveis aos impactos resultantes das atividades humanas. Em Portugal ocorrem mais de 70 espécies de tubarões e 40 espécies de raias, e quase metade são consideradas ameaçadas pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). O nosso país está em terceiro lugar da Europa na quantidade de raias e tubarões desembarcados nas lotas, é o segundo maior exportador de carne de tubarão e o sexto maior importador de carne de raia do mundo. No caso das espécies que se encontrem em declínio são necessárias medidas de conservação, fundamentadas em informação científica sobre a distribuição, abundância e ciclo de vida destas espécies. Para isso é fundamental desenvolver programas de monitorização para estudar a sua biologia e identificar as áreas de maior importância para a sua reprodução, crescimento e alimentação (áreas prioritárias para a sua conservação).
Miguel Pais, investigador do MARE e um dos coordenadores do estudo, sublinhou que “o trabalho desenvolvido é relevante, não só pelos resultados obtidos, mas sobretudo porque demonstra que é possível gerar informação de base significativa para a gestão de Áreas Marinhas Protegidas, num período de tempo relativamente curto, partindo do conhecimento local de quem vive do mar há muitos anos”. De acordo com Marisa Batista, primeira autora do artigo e também investigadora do MARE durante este projeto, “foi determinante a colaboração entre todas as partes, nomeadamente a ajuda valiosa dos pescadores e empresas marítimo-turísticas locais, não só com informação sobre a ocorrência histórica e atual das espécies, mas também com o conhecimento prático que facilitou muito o nosso trabalho com as câmaras iscadas, num mar que conhecem muito melhor que nós”.
Os autores destacaram ainda a parceria com o centro de mergulho JustDive, em Peniche, que “foram os parceiros logísticos do projeto, estando sempre dispostos a levar-nos para o mar a qualquer hora do dia ou da noite, durante várias horas de trabalho árduo, a armazenar e transportar material, sempre num ambiente de companheirismo e com partilha de conhecimento sobre os fundos marinhos daquela zona”. Por fim, sublinharam a importância da colaboração com a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), que forneceu os dados de observadores a bordo de barcos de pesca obtidos no âmbito dos seus projetos de conservação na RNB, “sem os quais este estudo não teria sido possível”.
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Investigadora do MARE, prepara o isco para uma câmara que será largada ao largo dos Farilhões (à direita). Fotograma de uma câmara iscada, que registou a passagem de uma tintureira ou tubarão azul - Prionace glauca (à esquerda)